Tata Fernandes, voz – A primeira vez que ouvi Itamar foi em 1981, na televisão. Fico louco tocava na abertura da novela. Os adolescentes, que marcou a estreia de Julia Lemmetz. Eu e minha irmã não perdíamos um capitulo por causa da musica, que não sabíamos quem cantava. A Vange Milliet, com quem eu tocava na banda UZI, foi quem deu a dica: banda Isca. Seu namorado, Lepetit, estava organizando o show Retro-expectativa, e nós duas entramos na banda Isca. Me apaixonei para sempre. Quando Itamar resolveu montar as Orquídeas, “porque não aguentava mais tocar com homem”, pediu que eu o ajudasse. A Nina e a Miriam moravam comigo. A Simoninha estudava comigo na Universidade Livre de Música (ULM), a Clara tocava com a Miriam em uma banda chamada Canastra. A Alcione, a primeira baterista, cedeu o local de ensaios.
Simone Soul, bateria – Eu conhecia bem o som do Ita. Era casada com o enteado do Gigante, o Tiano, e tocava bateria desde 1986. Na ULM conheci a Nina e, quando a Alcione saiu, entrei no lugar dela. No primeiro ensaio ele falou de uma maneira tão especifica que foi um pouco difícil de entrar no universo dele. Mas logo nos afinamos. Ai veio o Ataulfo e eu pude tocar com o Gigante. Hoje vejo o quanto o Giga representa a música do Itamar. Itamar deixou no ar essas sementes todas, polinizadas.
Miriam Maria, voz – Cada uma de um lugar, cada uma tinha um nível de formação Como combinar tudo isso? O Itamar partiu de um som que já existia, Secos & Molhados, para a gente se encontrar como sonoridade de banda. Foi tão natural e gradativo que quando percebemos só estávamos tocando as coisas dele, Itamar. Ele sabia das coisas, não é? E ele é pulsação, coração-pulsação, aquele bum-bum. E é uma conexão de sutilezas.
Lelena (Maria H. Paula Sousa Anhaia de Mello), baixo – Eu já tinha tocado com o Luni, com o Skowa e a Máfia, e na banda do Tonho no cursinho Intergraus, e, São Paulo. E vi aquele show no Lira Paulistana com a rede de corda, animal. Amava o Itamar. No primeiro show das Orquídeas na Funarte não pude ir e colocaram a Clara no meu lugar. Ficaram, dois baixos e Itamar fazia duas linhas de baixo. Pentelha invoquei. Cheguei a sair. Implorei para voltar.
Renata Mattar, voz, saxes, flautas e sanfona – Sou de uma família de músicos, mas tradicional. Aos 16 anos vi o Itamar na Funarte e pirei. Descobri que existia uma coisa completamente diferente. Segui os shows e dez anos depois estava próxima dele. Tocava com a Lelena, Simoninha e a Tata no grupo As pastorinhas. Cheguei nas Orquídeas quando o disco já estava pronto, mas o Itamar colocou uma foto no encarte e ensaiávamos todo dia. Eu tocava flauta e sax. A sanfona veio depois. O Itamar era tão absurdamente intenso e criativo que a gente vai descobrindo todo dia uma coisa nova dele.
Geórgia Branco, guitarras – Fui convidada para entrar na banda enquanto assistia à Cássia Eller cantando no vão livre do Masp. O Itamar estava no pé do palco. Fiquei tão emocionada que no primeiro ensaio fui de bicicleta, sem me tocar que era longe! Não estou na capa dos discos por que tinha ido para Londres. Fiquei oito meses na Europa, e o Itamar ligando: “Meu, vem aí que nós vamos gravar”. Mas deu tempo de colocar as guitarras. Para o encarte, ele pegou uma foto 3×4 e fez um enxerto, mas nos primeiros shows me deixou de castigo na plateia. Ele curtia pedal de wah-wah e virava para trás fazendo “uá! Uá!” com a boca. Tenho isso fotografado na minha memória. A única pena é que ele era santista.
Adriana Sanchez, teclados – Eu tocava com algumas Orquídeas em outros projetos e o Itamar queria um teclado. Le me ligou explicando a proposta, simples e direto. Foi uma rara oportunidade. Eu tocava com bandas de estilos variados e até cover. Depois que se trabalha com o Nego Dito, nunca mais sua música é a mesma, a gente nunca mais é a mesma. Na sua cabeça, ele já sabia o que cada instrumento ia fazer, sentava na frente de cada uma, mostrando exatamente o que queria.
Simone Julian, sopros – Tinha estudado flauta e tocava em shows do colégio Oswaldo Cruz. Na hora que pintou o convite, eu fiquei louca. Afinal, era para tocar sax. Será que eu consigo? A flauta funcionava como um teclado, tinha linha definida. Logo de inicio queria que a gente tocasse as músicas dos Secos & Molhados. A gente ia tirando e ele em um canto. Ele nem via o resultado. Logo estávamos tocando as composições dele. E era um barato, porque ele tinha esse lado relaxado, mas era rígido, um paizão exigia que a gente decorasse o roteiro do show. Eram ensaios de seis horas, quer dizer, durante as primeiras quatro ele ficava na dele, nem falava com a gente. Ele criava tudo.
Nina Blauth, voz e percussão – Fui uma das primeiras a entrar. Tinha começado a tocar bateria há pouco tempo em uma mini big band em Novo Hamburgo, no Rio Grande do Sul, onde morava e fazia teatro amador. Vendi tudo, me separei e vim estudar na ULM, Logo sai porque os ensaios eram o dia inteiro. Conhecia a Vanguarda Paulista, ouvia na radio Ipanema nos programas de Cunha Jr., gaúcho. Anos mais tarde, tocamos em Berlim, Munique e Tübingen, só os dois. Minha temporada com o Circo Acrobático Fratelli acabava em Portugal e eu havia ganho um Europass da minha família. Foi maravilhoso nós juntos na Europa. Em paris nos juntamos ao Duofel e a um grupo de jazz improvisamos.
Clara Bastos – Livro de canções
Quando recebi o telefonema do Itamar com o convite de realizar estas transcrições, minha cara de espanto não pode ser vista. os olhos um pouco arregalados não eram só pela responsabilidade, eram por lidar com o que parecia ser uma contradição. Como faria caber em algumas folhas de papel este gigante?
jamais uma partitura seria capaz de conter o suingue e a dicção perfeita que abraça as as palavras ; a astucia e a inteligencia do ator respondendo de bate-pronto ao publico; o pleno domínio do palco, a gentileza e delicadeza de um verdadeiro prestador de serviços, como servo da musica; o senso de humor; a capacidade de autocritica ; a elegância e o carisma daquele homem esguio; a confiança e a liberdade de quem não deve nada a ninguém. Todas essas características, para mim, são indissociáveis desse artista integral. No entanto, a partitura é só um guia. Sua função não é contar historia completa.
De qualquer forma, havia outra questão bem pertinente. Quando ouvimos os primeiros discos, podemos perceber que os arranjos das musicas são contundentes o suficiente para serem confundidos com a composição da canção propriamente dita. um tipo de sonoridade construída para causar impacto, para tornar visível o compositor, cantor e instrumentista.
Itamar dizia que não valia a pena a empreitada se não fosse para realizar um trabalho muito bom, se não fosse para acrescentar à musica popular brasileira. Sempre falava do quanto escutou Jimi Hendrix, os batuques da cidade de Tietê, Milton nascimento e tudo que gostasse de ouvir à exaustão. Agradecia a Jorge Mautner e Arrigo Barnabé por sua entrada verdadeira na música como instrumentista e arranjador. E agradecia a Rogério Duprat , Hermeto Pascoal, Elis Regina e Paulinho da Viola – a quem pediu uma apreciação de suas musicas, para saber se realmente “dava pra coisa” . As pessoas e a vida foram confirmando para ele que de fato era um grande artista.
Clara Bastos é contrabaixista e formada em jornalismo. Dá aulas em escolas de música e participa de gravações de Cds e shows. Acompanhou Itamar Assumpção por mais de dez anos e fez transcrições das músicas do compositor para o songbook: Pretobrás Por que que eu não pensei nisso antes? O Livro de canções e histórias de Itamar Assumpção – 2006
Trilogia Bicho de Sete Cabeças
Primeira formação
Fonte: Pretobrás Por que que eu não pensei nisso antes? O Livro de canções e histórias de Itamar Assumpção 1 e 2 (Organizadores Luiz Chagas e Monica) 2006
Fotos: Extraídas do arquivo pessoal no Facebook de algumas delas.